Do que é feito um ano novo

Do ponto de vista da natureza, não existe ano novo. Todo tempo é novo, por definição, e existem alguns fenômenos cíclicos e outros lineares ocorrendo constantemente. As estações são (mais ou menos) cíclicas. A rotação da Terra é cíclica. Até o El Niño é mais ou menos cíclico. O ano solar não inova nada, nem fixa nada.

Na História, por mais que se diga que ela sempre se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa, os processos são lineares. Perdão, mas a História não se repete, nunca. Quem constrói as analogias e semelhanças são os historiadores. O objetivo é criar tipologias de fenômenos para melhor compreendê-los.

A vida de um indivíduo é determinada em primeiro lugar pelas ferramentas que ele tem para lidar com a realidade: suas atitudes e comportamentos. Estas, por sua vez, são determinadas por um conjunto de circunstâncias. Algumas não mudam: são a história pregressa da pessoa. Outras mudam com maior ou menor velocidade, tudo depende do cara: o conjunto de informações que ele tem para tomar decisões (mais ou menos bem informadas), as quais, por sua vez, podem mudar a relação com o contexto, que por sua vez configura novas demandas e assim por diante.

Existem indivíduos tão conservadores (e isso não é um julgamento ideológico, e sim um diagnóstico comportamental, pois um porra-louca que faz as mesmas porra-louquices o tempo todo é conservador) que podemos jurar que estão vivendo o mesmo tempo, o tempo todo. No entanto, todo indivíduo muda, ainda que bem pouquinho.

Isso se chama “processo de amadurecimento”. Crescimento, para uns, envelhecimento para outros – tanto faz, dá no mesmo.

Essas mudanças na vida do indivíduo têm determinantes contextuais externos, que são os calendários. Objetivamente, todo mundo segue calendários. Todo mundo, ou quase todo mundo, paga IPTU e IPVA, e isso acontece no começo do ano. Existe o ano letivo. Se você for relativamente normal, ele sempre será diferente. Existem os calendários competitivos, para quem é atleta. Assim, para nós, do hemisfério sul, depois do último campeonato de novembro, acabou o ano competitivo. É hora de planejar o próximo. E o próximo, por definição, será um NOVO ano. É a chance que temos de modificar estratégias de treinamento, dieta e preparação em geral. Não dá para fazer isso em julho, no meio do ano.

Comercialmente existe ano novo e ele começa em outubro do ano anterior. Não planejar até outubro o que será o ano seguinte é perder as melhores oportunidades.

Existem prazos anuais ainda maiores, de 12, 18 ou 24 meses. Por exemplo: existem projetos em que estou trabalhando agora que ficarão silenciosos (não visíveis) até 2013. Em 2013, eles serão parte do “ano novo”.

Assim, olhando bem de perto, existe, sim, um ano novo. E não entender isso pode ser catastrófico. No Brasil, embora o ano novo, como em qualquer país industrial, comece em julho do ano anterior, existe um lapso de ocorrências que vai do fim de novembro até logo após o carnaval. Pouca coisa relevante pode ser planejada para ser realizada publicamente neste período. No entanto, é nele que muito do ano novo é preparado, se tiver sido adequadamente planejado e garantido nos meses anteriores.

O último componente de um ano novo, no entanto, é o que de fato determina sua cara: o acaso. No final das contas, o resultado de qualquer ação depende muito do preparo e planejamento, mas será determinado pelo acaso. Não se deve contar com o acaso. Isso é o que fazem ingenuamente as pessoas que fazem (acreditando, pois a maioria faz só por desencargo de consciência) simpatias, mandingas e outras ações mágicas. Mas não se deve desprezá-lo. O mais importante, quanto ao acaso, é entender que ele geralmente tem um contexto. Ninguém ganha na mega-sena sem jogar. Ninguém rompe o ligamento agachando se não agachar.

O acaso pode ser favorável ou desfavorável, mas será um ou outro dentro das circunstâncias que proporcionarmos.

Eu acho muito bom que se festeje o ano novo, desde que se tenha motivo para tanto. Eu festejei. Duas coisas são “festejáveis” numa passagem para um ano novo: a primeira é o balanço do ano anterior (que foi novo um ano atrás, como um macro-ciclo em treinamento esportivo). As estratégias deram certo? O que pode ser corrigido? A outra coisa é um bom planejamento para o que está sendo inaugurado.

Na real, em dezembro, o ano seguinte já está construído. É isso que se comemora. Eu estou comemorando, e você?

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