Intelectuais questionam importância da atividade física vigorosa e do esporte na qualidade de vida e

 Intelectuais questionam importância da atividade física vigorosa e do esporte na qualidade de vida e longevidade: onde está a verdade?

Em junho de 2009, Arnaldo Jabor publicou um texto intitulado “Barriga é Barriga”, reproduzido em dezenas de blogs e sites pela internet. Nele, Jabor citou os colegas da indústria do entretenimento Chico Anísio e Dorival Caymmi, respectivamente humorista e músico, para corroborar seu ponto de vista segundo o qual exercício não é um fator relevante para a longevidade ou qualidade de vida. Para reforçar o argumento, agregou dados a respeito de outras espécies: tartarugas seriam longevas pelo ritmo lento de seus movimentos e baleias seriam contra-exemplos da eficácia de dietas hipocalóricas e de alta hidratação na manutenção de uma composição corporal saudável.
O texto é uma peça de humor divertida. No entanto, sua propagação serviu a um propósito argumentativo: ridicularizar a preocupação com o estilo de vida ativo e atlético advogado por vários profissionais da área da saúde. Adicione-se ao conteúdo engraçado do texto o glamour de figuras como Jabor, Caymmi, Jo Soares e Chico Anisio e pronto: temos uma perigosa receita para desqualificar a luta contra as doenças degenerativas geradas por estilos de vida inadequados.
É nosso dever, portanto, esclarecer o público quanto à natureza deste tipo de discurso. É divertido, é engraçado mas é basicamente falso. Em primeiro lugar, a longevidade média de espécies não relacionadas não tem nenhuma relevância científica. A expectativa de vida média de cada espécie não diz nada a respeito de seu “estilo de vida”. Em segundo lugar, o conteúdo citado por Jabor é chamado, na ciência, de “evidência anedótica”. Não têm nenhum significado epidemiológico. Casos podem ser úteis na qualidade de “estudos de caso”, os quais podem, ou não, informar pesquisa subseqüente com valor epidemiológico. O fato de que um indivíduo qualquer tenha sido sedentário e fumado até os 105 anos em nada muda as conclusões sobre as curvas de prevalência de câncer no pulmão, doenças cardio-vasculares e sua relação com o tabagismo e inatividade. Aqui entram as ferramentas da estatística.
Embora há muito se diga que atividade física só é saudável em moderação e que esporte não é saudável, desde os anos 1950s sabe-se que isso não é verdade. Em 1956, Montoye e colaboradores (1956) compararam 629 atletas com 583 não-atletas no mesmo ambiente e verificaram que não havia diferenças nem na expectativa de vida, nem no tipo de morte. Em 1971, Schnohr (1971) estudou 297 campeões esportivos na Dinamarca nascidos entre 1880 e 1910. Estes campeões tinham uma taxa de mortalidade significativamente menor do que a da população em geral.
Do ano 2000 em diante, uma série de estudos confirmou que não apenas a atividade física vigorosa promove maior qualidade de vida e mais longevidade, como atletas de alto rendimento são, por estes parâmetros, mais saudáveis do que a população em geral, ao contrário do que se acredita (Gajewski & Poznaska 2008, Teramoto & Bungum 2009, Apor & Rádi 2010).
Para não deixar o leitor sem as divertidas evidências anedóticas, aqui vão algumas: John Grimek, levantador de peso de nível Olímpico e posteriormente fisiculturista, morreu aos 88 anos de idade; o grupo SOS, “Skydivers over Sixty” (saltadores de para-quedas acima de 60 anos) tem 48 membros e vem crescendo nos últimos anos; a modalidade “ski aquático descalso”, que requer extrema agilidade, tem como notório representante George Blair, de 92 anos; Ken Mink, com 73 anos, dribla garotos com um terço de sua idade no basquete competitivo; Effie Nielson, uma senhora de 90 anos, participa de campeonatos de powerlifting (levantamento básico) e quebra recordes mundiais em sua categoria.
Existem milhares de outras “evidências anedóticas” de que atividade física vigorosa e esporte de alto rendimento são para todos, promovem um estilo de vida saudável e longevidade.

Montoye, H.J. et al. Study of the longevity and morbidity of college athletes. J Am Med Assoc. 1956; 162 (12): 1132-1134.

Schnohr, P. Longevity and causes of death in male athletic champions. The Lancet, Volume 298, Issue 7738, Pages 1364 – 1366, 18 December 1971

Abela, E.L. & Krugera, M.L. Longevity of Major League Baseball Players. Research in Sports Medicine, Volume 13, Issue 1 March 2005 , pages 1 – 5

Apor P, Rádi A. [Master sportsmen. Health status and life expectancies of physically active elderly] Orv Hetil. 2010 Jan 17;151(3):110-3.

Teramoto M, Bungum TJ. Mortality and longevity of elite athletes. J Sci Med Sport. 2010 Jul;13(4):410-6. Epub 2009 Jul 1. (estudo que mostra que a expectativa de vida de atletas é maior que o da população)

Gajewski AK, Poznanska A. Mortality of top athletes, actors and clergy in Poland: 1924-2000 follow-up study of the long term effect of physical activity. Eur J Epidemiol. 2008;23(5):335-40.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima