“Tá leve”, “vai que é sua”, “ta feito”: como entusiasmar seu amigo

Qualquer um que já tenha assistido um campeonato de levantamento de peso ouviu as frases de apoio dos amigos para os atletas. Aliás, são esportes muito simpáticos, onde mesmo desconhecidos recebem torcida da platéia. É muito difícil haver vaia ou manifestações de “torcida contra”.

As frases mais ouvidas são as seguintes:

–  É sua

– Tá leve

– Cê já fez isso

– Tranquilo

– Come a barra

E outras expressões de natureza qualificativa do levantador como:

– Aí, guerreiro

– Aí, monstro

– Aí, animal

E assim por diante.

Muitas vezes o próprio atleta repete alguma frase (isto se chama de “psyching-up” e, no caso “self psyching-up”), que pode ser um comando ou um auto-estímulo.

Já vi muitos atletas repetirem “tá leve, ta leve, ta leve, ta leve…”, entrarem embaixo da barra e falharem.

O problema é que esta frase pode até ser bem intencionada, mas é falsa. NÃO está leve, por definição. O esporte é de levantamento de peso, e não de teste de repetições. Por mais que seja uma carga conhecida, uma primeira pedida segura, a verdade é que está PESADA, e não leve.

Dizer que está leve é conhecido como “denial” (negação) e não é a melhor das alternativas para torcer por seu amigo.

Já “tranqüilo” depende. Se for um comando, cuja expansão seria: “fique tranqüilo, no sentido de sem medo e controlado”, pode ser um bom estímulo, principalmente se o atleta estiver nervoso e apavorado.

Mas se “tranqüilo” quiser dizer “está tudo tranqüilo, pode relaxar”, é um comando ruim. Não está nada tranqüilo e o foco de que o atleta necessita é um foco concentrado, preciso, de exercício de força máxima pontual. Ele tem só uma chance. Não é verdade que esteja tudo “tranqüilo”.

“Come a barra” é o comando oposto. Indica a sugestão de que o atleta vá com muita energia e emoção para encontrar o peso. Também pode não ser um bom comando. Se o atleta já é “pilhado naturalmente”, em geral é inócuo. Equivale a dizer “seja você mesmo”. Se o atleta é apavorado, é mais pressão emocional para que ele aja de maneira diferente da que sabe.

O melhor comando que eu conheço é aquele que meu primeiro técnico, Gilson, dizia: “ta feito”.

“Está feito” é uma expressão que reflete algo muito importante na vida de um levantador de peso: ainda que aquela carga jamais tenha sido feita por ele em treino, em alguma dimensão ela existe. Ela já foi feita.

Estudos (e a experiência no esporte) mostram que levantadores de peso experientes executam freqüentemente suas cargas mais elevadas em competição. Isso é ao mesmo tempo estratégico (a “máxima” é deliberadamente evitada em treinamento pelos conhecidos fenômenos de desgaste neural) e um efeito do contexto competitivo.

Então, como é que o movimento pode “estar feito”, como diz Gilson? Porque na mente do levantador, aquela carga e aquele movimento devem ter sido já incorporados e interiorizados. Fazem parte dele. Treina-se isso tanto fisicamente (com cargas de sustentação superiores às que serão tentadas) quanto mentalmente.

Muitas vezes, no entanto, o levantador tem medo de não conseguir. Isso pode ocorrer principalmente quando se trata de uma quebra de recorde. O recorde, como toda carga jamais executada, é uma barreira mental.

Assim, lembrar o atleta de que o movimento “ta feito” é a melhor forma de torcida e estímulo a um levantador de peso.

Pode refletir algo mais transcendente: em uma dimensão interna qualquer, aquela força existe dentro do levantador. Em alguma dimensão estranha, talvez já tenha sido executada (viagem, hein).

ESTÁ FEITO – seu papel é apenas ser instrumento de sua manifestação concreta.

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