Nos primeiros cinco minutos….

… tive a certeza de que seriam as piores férias da minha vida: cansada, suja, menstruada, sozinha em Paris e minha reserva no albergue da universidade não existia mais. Fui ao serviço de assistência a estudantes desesperados (certamente tem outro nome) e me juntaram com duas inglesas. Em pequeno bando, fomos para um dos hoteis mais esquisitos e fedidos de Paris, onde minha cama tinha um buraco no meio para o qual minha bunda escorregava ao deitar. Foi então que abri a janela e vi o Moulin Rouge e a noite ensolarada do verão parisiense no primeiro dia das melhores férias da minha vida nos 28 anos seguintes

… olhei para ele, ali na minha frente, de óculos, esquisito e não achei absolutamente nada. Continuei não achando nada. Duas horas depois achei-o simpático e gentil. Continuei achando isso por três meses. Seis meses depois de contato diário, me apaixonei pelo homem que seria o maior amor da minha vida.

… olhei para ela, toda linda e perfeita, e sabia que faria tudo o que os nove meses de gravidez me permitiram planejar detalhadamente como a maternidade ideal: nada de doces, apenas quality time, paciência infinita para uma criança destinada a transformar o universo por crescer segundo princípios impecáveis. Três anos depois pensei, alarmada, que aquela noite seria a dor de barriga do século, enquanto observava minha filha devorando selvagemente meia bandeja de brigadeiro numa festa. Mais três anos de “surpresas” depois, berrando com ela para tomar banho pela milésima vez, me dei conta de que eu nem sabia mais o número de cagadas feitas como mãe.

… nossos olhares cruzaram sob o batente de uma porta. Faíscas saíram de nossas pupilas e nossos corpos. Ele disse “eu também prefiro raw”. Eu não disse nada, apenas sorri. Ele disse: “não vai embora, eu te acho depois, vou cuidar do meu parceiro”. Ele seguiu para um lado, eu para outro, segura de que tinha rolado uma “super” química. Então a súmula deu problema, saí para buscar clipes, fiz uma apresentação, cuidei da arbitragem e nunca mais vi o cara. Nem lembro da cara dele.

… achei-o o cara mais antipático, besta e desagradável que havia conhecido em muito tempo. Mantive a mesma opinião enquanto tínhamos que revezar a mesma barra durante poucas tardes de treino do mês. Anos depois nos falávamos e nos víamos todos os dias e mais tarde ainda sentei no chão chorando desesperada, com medo de que morresse um dos melhores amigos que tive na vida.

… quase nunca gosto das pessoas. Boa parte volta à massa amorfa dos desconhecidos, pois me desinteresso. Uma parte passa a ser de convívio tolerável. Outra agradável e uns pouquíssimos se tornam amigos. Mas nos primeiros cinco minutos me pareceram péssimos.

… eu não sei nada. As chances da minha impressão ter alguma aderência ao real é baixa. Impressões são baseadas em evidência insuficiente. Pessoas são não apenas complexas, como mudam com o tempo. Já achei que tinha achado meu melhor amigo nos primeiros cinco minutos. Foi verdade. Até que a grana, o poder e os interesses falaram mais alto e nossa amizade foi sacrificada por ele no altar dos deuses inimigos.

Quem quer que tenha inventado esse negócio de que a impressão que temos nos primeiros cinco minutos é a certa, criou mais uma dessas lendas urbanas que, repetidas vezes o suficiente, ganha cara de verdade.

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