Segundo Max Weber, poder é a oportunidade residente nas relações sociais que permite a alguém realizar sua vontade mesmo que contra resistência, independente no que consista essa oportunidade. Quando o exercício desse poder envolve exercer força contra tal resistência, falamos em coersão.
É muito parecido com o sentido de “controle”. Controle é a capacidade de exercer influência ou autoridade sobre algo.
Do ponto de vista sociológico, poder implica “relações de poder”, já que ninguém possui zero poder. A capacidade de exercer poder depende da distribuição do mesmo entre as partes que se relacionam.
Do ponto de vista individual é diferente. A forma e quantidade de poder determina a POSIÇÃO ou LUGAR da pessoa em um sistema social qualquer, ou seja, quem ela é naquela sociedade. Numa sociedade estratificada e complexa como a nossa, o poder é traduzido de formas muito diferentes para cada sub-cultura, , mas sempre, em qualquer hipótese, poder é diretamente proporcional ao que quer que seja considerado benefício para aquele grupo. Todos querem poder e lutam por ele. Alguns amigos meus cientistas fazem sacrifícios indescritíveis para aumentar o número e índice de impacto de suas publicações. No mundo da ciência, publicações referenciadas são os indicadores admitidos de mérito. Mérito é reconhecimento. Reconhecimento é a base da atribuição de poder no campo científico.
Outros amigos fariam qualquer coisa por uma promoção na empresa. Com a promoção, vêm novas atribuições, novos subalternos e um novo e mais alto salário. Mais gente para controlar. Mais dinheiro para comprar conforto material. Mais dinheiro para significar posição, status.
No entanto, todos temos uma relação ambivalente com o poder. Poder implica que outros e outras coisas têm também mais poder sobre nós – é sempre relacional. Mais poder, mais capacidade de controle, também implicam mais responsabilidade. Às vezes perder poder pode ser libertador. Não ter poder nenhum é, de certa forma, cômodo.
Existem aquelas pessoas, que todos já conhecemos e alguns de nós somos, que têm uma relação irracional e sem objetividade com o poder. Pessoas que precisam controlar rigorosamente tudo. Todos já tivemos chefes assim. Quando olhamos de perto para essas pessoas, vemos que elas buscam freneticamente uma coisa perdida. Na esfera privada, telefonam para esposas, maridos e filhos para saber onde estão; precisam de previsões precisas sobre todos os acontecimentos; fazem contas, cálculos, tudo com uma dose exagerada de ansiedade. Mudanças no horário do vôo, atrasos, desencontram tiram essas pessoas do eixo. São os “control freaks”.
Ninguém jamais conseguiu demonstrar a relação entre a quantidade de poder inter-pessoal e coisas como “satisfação” e “felicidade”. Os “control freaks” são sempre infelizes, independente da quantidade de poder de fato que concentrem em suas poderosas mãos.
Na verdade, existe sim uma relação e ela é direta, entre a quantidade de poder que se tem sobre si mesmo e o capacidade para este estranho estado que alguns chamamos de felicidade, outros de serenidade, outros de plenitude. Para mim tanto faz. Esse poder sobre nós mesmos implica coersão, sistemas de controle e submissão e análogos de muitas formas de poder inter-pessoal conhecidas. Confrontamos tendências de nossos metabolismos energéticos, de nossos neurotransmissores e de nossos hormônios. Submetemos NOSSAS NATUREZAS à nossa vontade.
Ontem tive informação sobre duas situações de perda absoluta de controle. Uma de uma moça, jovem mãe, que ganhou mais de 30 quilos depois do parto. Procurou a ajuda do grupo ao qual pertenço de atletas, praticantes e estudiosos de treinamento. Contou que buscou os serviços de um personal trainer, nutricionistas e médicos, mas o relato dela mostrou que foi obviamente muito mal-orientada. Nos achou e buscou nosso apoio. Ela tomou pelo menos 6 medidas pró-ativas para recuperar o controle sobre seu corpo: 1. buscou uma academia; 2. contratou um personal trainer; 3. se engajou num programa de treinamento; 4. contratou um nutricionista; 5. está seguindo uma dieta; 6. contratou um endocrinologista.
O outro caso é de uma mulher obesa e portadora de desordens mentais que conheço há alguns anos. Ela também deve estar cerca de 30 ou 40 quilos acima de seu peso adequado. No entanto, ao contrário da moça anterior, não toma nenhuma iniciativa no sentido de solucionar nenhum de seus problemas. Pelo contrário: repele as tentativas que outros fazem de removê-la de sua relação com a infelicidade e a degradação física e mental.
Sou otimista em relação à primeira moça e pessimista em relação a esta mulher. Mais de uma década de convivência com ela ilustrou uma perversa satisfação vigente entre os humanos com a própria miséria, o cruel prazer da irresponsabilidade de que o escravo goza.
O poder sobre si mesmo envolve coersão e disciplina, como eu disse. Combater outras vontades: vontades ditadas por nossa insulina, pela propaganda da indústria alimentícia e de consumo em geral e a vontade de outras pessoas que se expressa dentro de nós. Criar sistemas arbitrários de prioridades e comportamentos, segundo aquilo que acreditamos, e impô-los.
O poder sobre si mesmo é a única forma de poder positivamente relacionada com a saúde integral – corpo e mente. Naturalmente, na condição de miséria socio-econômica, ninguém consegue desenvolver poder sobre si mesmo porque faltam as condições mínimas para que o indivíduo desloque alguma atenção das tarefas da sobrevivência imediata. O poder sobre si mesmo requer auto-atenção.
Cada pessoa acha seu caminho em direção ao aumento desse poder. Alguns desenvolvem técnicas de controle mental, como a meditação. Outros, como eu, buscam a disciplina do corpo e da mente através de atividade física e controle da alimentação. Não importa por onde se vá.
Hoje, não tenho dúvidas de que o único poder que importa é o poder que temos sobre nós mesmos.
Marilia