Privilégios, direitos, culpa, obrigações e escolhas: “pick your battles”

Alguns termos estão pedindo para receber uma definição adequada e des-ideologizada, pelos dois falsos lados (direita e esquerda, partição metafórica que perdeu fundamento na prática política): PRIVILÉGIO é um deles. Ambos os pseudo-lados usam esse termo de forma inteiramente inadequada. Quase sempre, aquilo a que se referem como “privilégio” é um DIREITO ou CONDIÇÃO HUMANA FUNDAMENTAL.

Para os que não têm, a busca para obter não é apenas moralmente justa (coisa que produz uma reação emocional bem irritante), mas LÓGICA. É intuitivo que numa sociedade em que uns gozam de determinados direitos e outros não, os que não gozam deles vão tentar obtê-los.

Para os que têm, não há nenhuma culpa em tê-los e nenhuma responsabilidade acoplada. O motivo é simples: o número de sub-populações, numa sociedade plural, que NÃO goza de direitos é imensa. Não é RESPONSABILIDADE ou OBRIGAÇÃO de quem goza lutar pelos direitos de quem não goza: é ESCOLHA.

Assim, aos da pseudo-direita, nenhuma minoria está querendo privilégios: apenas uma lógica e racional busca por um direito que está aí, disponível na sociedade. Se está disponível e a sociedade é democrática, então é para todos. Se é para todos, aqueles que estão excluídos de seu gozo OBVIAMENTE vão reivindicar ser contemplados com tal direito. Não entender isso não é só preconceito: é burrice.

Para os da pseudo-esquerda, é hora de entender que quem goza de direitos (a famosa classe média de que todos fazem parte mas gostam de desqualificar hipocritamente em público) simplesmente tem o que é o direito, o certo, ter. É um direito disponível em uma determinada sociedade (digamos: segurança, saúde, educação, tratamento dissociado de sua condição étnica e de sexo, etc, pois são direitos constitucionais). Assim, não é o homem que tem o “privilégio” de ser tratado com respeito num ambiente de trabalho, sem ser objeto de assédio. Este respeito é seu direito. São as mulheres que têm este direito transgredido é que estão sendo usurpadas dele. O homem comum, completando seu planejamento de obra ou análise de dados, não é nem privilegiado e nem tem obrigação nenhuma em relação à sua colega que foi vítima de constrangimento ilegal e assédio moral, na sala ao lado, pelo chefe ou pela chefe. Já o chefe (em geral um homem) cometeu um crime. Mesma coisa entre etnias: não é o homem caucasiano que anda na rua sem que lhe lancem olhares de nojo, comentem a qualidade ruim de seu cabelo ou tirem suas terras para praticar garimpo que está tendo privilégios. É o negro humilhado e o índio cujas terras foram ilegalmente tomadas que tiveram direitos usurpados.

Não entender isso é algo que ainda não sei até que ponto é burrice, falta de domínio sobre a própria racionalidade e revanchismo inconsciente e até que ponto é o oportunismo, o golpismo e o revanchismo consciente típicos do stalinismo e todas as suas sub-espécies (trotskismo, maoismo, etc).

Existe uma expressão em inglês que é “pick your battles” (escolha suas batalhas). Cada um escolhe por o que lutar, quando, como e onde. Não é necessário nenhum modelo sociológico novo para entender que praticamente todas as formas de violência social estão inter-relacionadas, ainda que não tenham relações causais. O mesmo se pode dizer em relação a todas elas e elementos estruturais da economia. Transformar estas inter-relações em programa é uma opção PARTIDÁRIA e ASSOCIATIVA. Assim, é ok um partido ter em seu programa lutar contra um menú de expressões de violência social.

Não é nada ok, sob argumento nenhum, impor estas associações a um movimento pautado numa causa pontual. É simples golpismo: tentativa, basicamente modus operandi de determinadas seitas, de tomar de assalto movimentos e transformá-los em ação partidária.

Enquanto isso não for entendido pela maioria ingênua que apoia os movimentos, as seitas de inspiração totalitária, não importa a longitude metafórica que reivindiquem (e eu não reconheça: direita e esquerda), terão sempre carta branca para desvirtuar qualquer proposta objetivamente formulada.

Pluralismo e democracia são difíceis, mas não zelar por eles é correr riscos de extrema gravidade em relação ao totalitarismo que está sempre à espreita.

 

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